Eu acreditava que estávamos bem, que finalmente a atmosfera que nos envolvia estava mais calma. De certo modo, estava. Gael me retirou da prisão e me reintegrou ao convívio com os outros humanos. Era como um favor que ele havia feito, e eu não gostava nada disso. Eu não era um animal de estimação que se leva de um lado para o outro e, quando não se quer mais, se descarta. Nem com os animais se deve fazer isso.Enquanto saboreava a carne suculenta de cordeiro servida no almoço, senti os passos pesados se aproximando.— Então quer dizer que meu filho te perdoou. Ele é muito piedoso e te deixou poucos dias naquela prisão. Se fosse eu, teria deixado por meses.Revirei os olhos.— Ainda bem que você não é ele. Por favor, já fizeram o que quiseram comigo, inclusive me colocando em um ringue para lutar com leões. Não acaba essa rivalidade inexistente entre nós duas? Não há motivo para isso.— Não. Só ficarei satisfeita quando você desaparecer da minha vista. Eu juro que farei da sua vida uma
No meio da floresta fria, e das pilastras do palácio, eu os ataquei. Transformada em minha loba, não me importava com o que ia acontecer. Eles eram muitos, atacavam como se não tivessem medo de me ferir gravemente. Eu respondia na mesma medida. Eu sabia que no fundo, Gael havia ordenado isso, que se por um acaso eu me transformasse, eles revidassem com toda força.Então eu saltei no corpo de um guarda, abocanhei seu pescoço e joguei longe. Dois vieram em minha direção e logo desviei, fazendo com que eles acoplassem suas espadas ao meio do tronco. Eu corri em busca da saída, mas logo outros guardas apareceram. Uma batalha épica começou. Eu não me importava de quantos golpes estavam a me ferir, Lua era uma brava guerreira, e alguns cortes não seriam o suficiente para machucá-la. "Nossa força está em você." Como se escutasse o que eu estava pensando ela me respondeu. "Eu acredito em você, Kira."Com uma pitada de adrenalina, a minha força se multiplicou. Se antes eu estava compadecente
O frio daquela noite parecia cortar minha pele como lâminas afiadas, mas o calor da lareira na cabana de Tyson mantinha o ambiente acolhedor, quase sufocante. Nossa conversa não havia terminado. Ao me recordar daquela carta sobre seu relacionamento com minha mãe, a sensação de tristeza voltou a me visitar. Eu me afastei dele quebrando a conexão que tínhamos feito.Ele se aproximou, deixando sua presença preencher o espaço, trazendo memórias antigas à tona. Eu senti um frio na espinha, um desconforto que nunca havia sentido antes.— Kira, por que se afastou? ele perguntou, a voz grave ecoando no silêncio da cabana.Olhei para ele, tentando encontrar uma resposta que fizesse sentido, mas a verdade era que nem eu sabia ao certo. — Eu... só precisava de respostas, Tyson. Murmurei, as palavras saindo mais frágeis do que eu pretendia.Ele suspirou. As suas passadas eram desconfortáveis, como se ele soubesse o que eu estava pensando.— Respostas. Repetiu, com um tom amargo. — Você sabe que
A luz da manhã invadia a cabana, filtrada pelas cortinas de linho que balançavam suavemente com a brisa. Eu abri os olhos, sentindo o calor do sol aquecendo meu rosto. Por um momento, me perguntei onde estava, mas o cheiro de café fresco e pão assado logo trouxe a realidade de volta. Eu estava na cabana de Tyson, o homem que tinha acabado de abalar todas as minhas certezas.Levantei-me devagar, sentindo a madeira fria sob meus pés descalços, e segui o aroma até a cozinha. Senti que Tyson Estava à espreita, talvez preparando algo ao fogão. Por um momento eu sorri. Mas então, a lembrança da noite anterior voltou com força"Bom dia," ele disse sem se virar, como se já soubesse que eu estava ali.— Bom dia. Respondi, minha voz rouca de sono e das emoções não resolvidas.Tyson se virou, trazendo uma bandeja com pães quentes, café e frutas. — Espero que tenha dormido bem. Disse ele, colocando a bandeja na mesa entre nós.Assenti, embora o sono tivesse sido inquieto, cheio de sonhos confuso
O som da porta sendo arrombada foi como um trovão. O estrondo ecoou pelas paredes da cabana, e meu corpo instintivamente se retesou. Tyson se colocou na minha frente em uma postura defensiva, mas o estrago já estava feito. Eu me virei, meu coração pulando uma batida, e o vi. Gael, meu marido, o príncipe estava na entrada, sua silhueta imponente recortada contra a escuridão da floresta lá fora.Os olhos dourados de Gael, sempre tão frios e calculistas, agora brilhavam com uma intensidade assustadora. Ele estava furioso, mais do que eu jamais o tinha visto. A raiva em seu olhar era palpável, e eu soube, no momento em que nossos olhares se cruzaram, que ele sabia de tudo. Sabia sobre mim e Tyson, sabia sobre nossa fuga, e estava ali para pôr um fim a isso.— Kira. Ele disse, e sua voz era tão grave e autoritária quanto eu me lembrava. Era o tipo de voz que não deixava espaço para contestação. — Chegou a hora de voltar para casa.Eu senti Tyson se mover ao meu lado, seu corpo irradiando t
Retornar ao reino de Gael era um martírio para minha mente. Eu só queria que chegasse o final dos tempos para que eu não permanecesse mais ao seu lado. Á medida que a carruagem se aproximava dos portões, uma sensação inquietante se instalou no meu peito. Eu, Kira, loba e princesa de Gardênia, sentia as garras do destino apertando-se ao meu redor, advertindo-me do que estava por vir.A primeira visão do castelo, que antes representava um refúgio seguro, agora parecia distante, frio, envolto em sombras que dançavam com o vento. Os guardas no portão olharam-me com desconfiança, como se eu fosse uma estranha. Mas nada poderia me preparar para o que estava prestes a encontrar.— Ora, ora, vejam quem voltou. — A voz fina e melodiosa ressoou com um veneno que me gelou o sangue.Ketlin, a amante de Gael, apareceu na porta, seus olhos brilhando com uma satisfação maligna. Ela sempre foi uma presença perturbadora no castelo, uma sombra que pairava sobre meu casamento.— Agora o caminho está liv
A noite estava particularmente fria, mais do que de costume. Sentia o vento gélido correr pela pele, arrepiando o pelo enquanto eu me movia pelos corredores silenciosos de Gardênia. Cada som parecia amplificado, cada passo meu um eco na escuridão. Meu coração batia forte, como se estivesse tentando romper meu peito. Algo dentro de mim dizia que esta noite seria a última vez que eu pisaria naquele chão.Tyson estava perto. Eu não podia vê-lo, mas podia sentir sua presença. Era reconfortante e ao mesmo tempo esmagadora. Ele sabia o que eu estava prestes a fazer. Ele sabia o risco. E mesmo assim, estava disposto a arriscar tudo por mim. Por nós. — Kira, está na hora — ouvi sua voz, baixa e firme. Ele estava à espreita, pronto para agir. Eu sabia que, se desse um único passo em falso, tudo estaria perdido. Mas hesitar não era uma opção.Respirei fundo, buscando a calma que parecia sempre me escapar nos momentos mais críticos. Eu sabia que Gael não demoraria a perceber. Ele sempre foi a
Seguimos pelo portão, deixando para trás o príncipe que, em outra situação poderia ter dado certo. O vento frio nos envolveu, e a escuridão da floresta nos acolheu como uma velha amiga.— Vamos, Kira. Temos uma longa jornada pela frente — disse Tyson, puxando-me para mais perto dele, o calor de seu corpo me protegendo do frio.Cada passo fora daquele castelo era uma vitória, mas também uma batalha contra o arrependimento. Não por ter ido embora, mas com quem eu estava indo. Senti o peso da decisão de estar voltando ao meu passado, com um homem de segredos obscuros, o homem que, apesar de tudo, eu amava. Mas também sabia que era a coisa certa a fazer. Eu precisava ser livre, precisava ser eu mesma. E Gardênia não era o lugar onde isso seria possível.A caminhada pela floresta foi longa e silenciosa. Tyson guiava-me com cuidado, desviando de galhos e raízes, protegendo-me como sempre fizera. Não trocamos muitas palavras, mas sua presença ao meu lado era tudo de que eu precisava.Finalme